Vicariato Episcopal Norte




segunda-feira, 1 de novembro de 2010

O NATAL DE MARIA DE NAZARÉ E A MARIA DO NATAL DE HOJE

O NATAL DE MARIA DE NAZARÉ
E A MARIA DO NATAL DE HOJE
Profª Drª Lina Boff
O Natal é, seguramente, a festa mais sentida e universal do Cristianismo. É uma festa celebrada até pelas pessoas que não acreditam no Deus dos cristãos. Por isso, ela é mais que uma festa celebrada pelo Cristianismo, é um espírito que envolve o coração, os sentimentos e veste de luz toda a criação que Deus plasmou e enfeitou com tanto carinho. Esse espírito de irmandade e fraternidade universal, faz com que as famílias se encontrem, troquem presentes, desejem Feliz Natal!, enviem cartões de Boas Festas, celebrem a Ceia de Natal que une e abraça a todos e a todas, na alegria, na luz e num ambiente em que o sagrado se faz presença e toma rosto na face de cada pessoa que reluz naquela noite.
Diante deste quadro tão bonito, como teria celebrado os aniversários de seu filho Jesus, Maria de Nazaré, aniversário que hoje nós chamamos de Natal? Muitas perguntas a respeito teríamos a fazer. Mas vamos recorrer um pouco a trajetória que Maria fez quando celebrava, junto com sua comunidade, seu marido José e seu filho Jesus, a fé que nutria pelo Deus da Vida. O que Maria rezava e celebrava quando ia ao Templo? Vamos ver algumas de suas orações proféticas e sálmicas que ela, com sua comunidade de fé judaica, fazia com Esperança e Fé.
Do profeta Isaías, provavelmente, Maria exultava de Esperança e Fé sempre que proclamava estas profecias: Povo de Israel, sabei que o Senhor mesmo vos dará um Sinal: Eis que a jovem conceberá e dará à luz um filho, que será chamado Emanuel, isto é, Deus conosco (Is 7,14). O povo que andava nas trevas viu uma grande luz, uma luz raiou para os que habitavam uma terra sombria (Is 9,1). Ó Jerusalém, põe-te em pé, resplandeça, porque a tua luz é chegada, a glória de Javé resplandece sobre ti. A ti virão os tesouros das nações e montadas em camelos trarão ouro e incenso para te presentearem (Is 60,5s). Finalmente, Miquéias, o profeta do Messias da descendência davídica, fala de maneira clara: E tu, Belém de Éfrata, embora a menor de todas as cidades de Judá, de ti sairá o Messias Libertador que o povo de Israel espera há tanto tempo. Ele trará a paz e a libertação para todos os povos (Mq 5,1s).
Dos Salmos, deduzimos que Maria de Nazaré tenha dado a estes, a preferência que o seu Deus sempre deu ao povo de Israel. Por isso, Maria proclama os salmos com Esperança e Fé. Ó Jerusalém, a ti vem o teu rei que liberta o indigente que clama e o pobre que não tem protetor. Ele os redime da astúcia e da violência, por isso, todos os reis da terra, se prostrarão diante dele (Sl 72,12s). Este é o dia que Javé fez para nós, exultemos e alegremo-nos nele.pois, o Salvador chegou entre nós (Sl 118,24).
Nesta Esperança Maria celebrava todas as festas de sua família biológica e de sua família de fé judaica. Hoje, Maria celebra esta festa de Natal, com mais de dois mil anos de distância, junto com seus romeiros e romeiras. Todos sabemos que Jesus se fez homem permanecendo Deus ao mesmo tempo. Por ser o Deus das pessoas mais necessitadas e humildes deste mundo, Ele quis entrar no nosso mundo escondido, participando do destino daquele que bate à porta, à noite, no frio, como fez José com sua mulher grávida, procurando lugar para que ela desse à luz com dignidade. Mas não encontrou lugar, a não ser numa pobre estrebaria vizinha. Lá havia palha, uma manjedoura, um boi e um burrinho que com seu bafo esquentaram o corpinho frágil do recém-nascido.
Assim Deus quis entrar em nosso mundo, silenciosamente, entrou pela porta dos fundos. Os grandes que habitavam em palácios das cidades de Jerusalém e de Roma, nada ficaram sabendo disso tudo. O Natal de Maria e de José, foi celebrado, não no meio de gente grande, mas no meio de pessoas simples como os pastores, e pobres como Maria e José, que batendo de porta em porta, ouviram estas duras palavras: “Não tem lugar para vocês”!
O que aprender deste Natal? Deus, quando quer se manifestar, não usa o espetáculo grandioso dos meios de comunicação, mas usa o silêncio simples das pequenas coisas da vida cotidiana. Foi assim que Ele veio e continua vindo para todas as pessoas do mundo inteiro. Mas, de maneira especial Ele vem para os pobres e simples de coração, porque assim Ele viveu no meio de nós. Nascendo entre os pobres, está sempre perto deles e a partir deles pode alcançar também os que têm riquezas materiais e não repartem com quem não tem. Dessa forma, ninguém fica de fora de sua vinda no Natal e ninguém é excluído de ser tocado pela presença de Deus que vem numa criança frágil e pequena como nós nascemos.
A reza que Maria fazia na Esperança para que Deus viesse libertar seu povo, se fez realidade através dela, no dia em que Jesus nasceu em Belém. Este mesmo acontecimento continua se atualizando em cada Natal que celebramos todos os anos. Mas sobretudo, vendo no Menino recém-nascido, aquele que pregou o Reino de paz e de bondade, e que por esse motivo morreu na cruz, mas ressuscitou para que todos nós tivéssemos olhos para ver a realidade com o coração. Assim podemos desfrutar da Graça Encarnada que nos vem no Natal.

MARIA NA CULTURA LATINO-AMERICANA E CARIBENHA

Maria na cultura latino-americana e caribenha
Significado e fé cristã
Lina Boff
Professora da PUC-Rio
Pós-doutorada pela Gregoriana de Roma

Introduzindo o assunto:
Antes de tudo queremos esclarecer dois conceitos básicos da nossa contribuição a este evento de estudo e reflexão: quando se fala da Comunidade divina fala-se da Trindade não como doutrina, mas como realidade, isto é, a Comunidade das Três Pessoas divinas está sempre presentes nos processos históricos e portanto ela é um fato; não depende das definições dogmáticas de várias tendências que se estabeleceram durante séculos; o Pai o Filho e Espírito Santo estiveram sempre presentes na história da humanidade, comunicando seu amor, inserindo o devir humano dentro da comunhão divina das três Pessoas. O segundo conceito que deve estar claro no nosso modo de pensar e de articular com a vida prática esta reflexão, é o de considerar a Maria histórica do NT, como a mesma Maria simbólica do universo cultural religioso do marianismo popular que povoa a cabeça dos povos do extenso Continente do Sul do Mundo.

1)- Quem é a Maria histórica

É a Maria de Gálatas 4,4 nascido de mulher, que é a Maria da narrativa dos quatro Evangelhos. É a mulher que age e re-age diante dos fatos históricos da nossa salvação. O primeiro deles é o da Encarnação libertadora. Este fato é o começo da nossa história salvífica com a presença humana de Jesus como ser histórico e como Pessoa da Comunidade trinitária, embora vivendo sua divindade ainda não revelada. Maria re-age a este fato pedindo explicação de como podia ser mãe sem ter tido relações conjugais com homem algum (cf. Lc 1,34); e age à explicação da teofania com quem estava falando, ao pronunciar seu SIM depois da explicação recebida e logo que vislumbrou o mistério de fé da revelação do Deus em quem acreditava e confiava plenamente como pessoa humana, age da mesma forma que cada um@ de nós poderia agir. Com a fé e o FIAT desta mulher do povo de Nazaré, tivemos a graciosa libertação de acabar com a distância que nos separava do Deus Pai e Espírito Santo, através de Jesus, o Filho.

O segundo fato histórico da nossa salvação é o do avanço na fé (cf. LG 58) que Maria realizou na sua vida terrena, sobretudo durante a vida pública de Jesus em que Ele pregava o Reino, na preparação da descida do Espírito Santo em Pentecostes que se plenifica na sua gloriosa assunção ao céu em corpo e alma (cf. LG 69). Nesta caminhada da fé terrena Maria re-age aos fatos salvíficos, auscultando a pregação do filho e guardando em seu coração, tudo aquilo que não compreendia; e age tomando as iniciativas que lhe eram inspiradas pelo Espírito que a continha e era contida por Ele.

Citamos algumas de tais iniciativas da Maria histórica, a Maria dos Evangelhos: visita Isabel e proclama o Cântico revolucionário do Magníficat tornando pública sua opção preferencial pelas massas pobres e excluídas (cf. Lc 1,53); chama a atenção do filho que se deixa ficar no templo discutindo com os teólogos da época sem dar nenhuma satisfação aos pais (cf. 2,48) ; percebendo a falta de vinho no casamento de Caná, comunica ao filho o fato e entra em contato relacional com os ajudantes da festa de Caná para saber como podia ajudá-los (cf. Jo 2,3.5); testemunha sua fidelidade ao Projeto salvífico da Comunidade trinitária ao pé da cruz de Jesus junto com suas companheiras de seguimento e o único homem que era João (cf. Jo 19, 25-27). Lá estava Maria de pé e não caída e chorosa; com sua presença age no retiro de preparação à vinda do Espírito Santo em Pentecostes (cf. At 1,14); e com sua adesão totalíssima à vontade da Comunidade divina, merece entrar na visão beatífica em corpo e alma, como sinal de esperança segura para o fim da nossa caminha terrena (cf. LG 68).

2)- As ‘Marias’ históricas de hoje

São aquelas que lutam do lado do povo e não se conformam com a situação que estamos vivendo. Nesse sentido elas se inspiram seja na Maria dos Evangelhos que na Maria do ícone de Atos. A mulher de hoje, arrastada pela atitude de Maria e inspirada na sua fé e coragem de aderir plenamente ao chamado do Pai e seu Projeto, acredita num modo novo de viver seu batismo, de testemunhar sua fé e de organizar a comunidade eclesial. A presença de Maria e as outras mulheres no evento Pentecostes criou e continua criando a nova comunidade do Espírito doado pelo Ressuscitado. Ora, nesta comunidade a mulher se identifica com a graça de ser chamada à condição original de reproduzir em sua vida e em seu corpo o gesto eucarístico da Comunidade divina pela Pessoa de Jesus Cristo. Alimentar seu povo com sua própria carne e sangue, foi a modalidade mais radical e intensa que a Comunidade divina encontrou para exprimir sua doação plena e deixar presente seu infinito amor no meio do povo que ama até à morte e ressurreição.

As ‘Marias’ de hoje realizam este gesto seja no ato da amamentação, no ato do martírio moral, psicológico, espiritual, como no martírio que exige versar seu sangue e água salvadores como se deu em Jesus Cristo. Parece-nos que aí está um veio promissor para a reflexão sobre o mistério abissal da Trindade como realidade histórica e como mistério de fé que ultrapassa a própria história. O mistério da presença real de Jesus Cristo no meio de seu povo que louva o Deus Trino da Nova Criação, proclama a revelação da Comunidade de Amor no seu modo de ser feminina e no seu modo de ser masculina, ao entrar em relação apaixonada e amorosa de coração-a-coração com seu povo.

3)- Significado para a nossa cultura: a Maria simbólica

Somos uma república mestiça e étnica culturalmente. Não somos europeus nem latino-americanos. A síntese de tantas antíteses é o produto singular e original que é o Brasil atual. Somos tupinizados, africanizados, orientalizados e ocidentalizados. Não fomos descobertos em 1500, mas continuamos encobertos e vivendo de um caldo de culturas distintas e ricas. Mas a nossa identidade está por ser construída ainda, sobretudo política e sócio-cultural. O Papa diz que temos uma identidade religiosa e cristã, mas nós precisamos caminhar e nos conscientizar muito ainda, muito mais do que tudo aquilo que o Papa disse a nosso respeito e a nosso favor.

Este é o quadro de fundo que nos leva a falar do marianismo popular que nasce da Maria histórica sim, mas que no universo cultural dos nossos povos ela passa a ser a Maria simbólica na cabeça e na prática de todos. As grandes divindades femininas ainda parecem povoar o universo simbólico e religioso do povo que vive numa cultura tão diversificada. A percepção da figura de Maria como símbolo e também como epifania simbólica, situa o povo para além de si mesmo e o leva não raras vezes, a viver e a desejar um mundo diferente do que vive. Esta simbólica é um dos fatores mais poderosos na inserção da fé popular da realidade definitiva em que acredita.

A nosso juízo, esta experiência devocional simbólica acrescenta à fé mariana popular, uma dimensão de relação com Maria extra-racional e imaginativa ou até mesmo fantasiosa, mas prenhe de fé e de esperança. Esta relação se dá entre a pessoa, a comunidade e o mundo cósmico. Diante de tal fato, a reflexão nos leva a criar uma nova antropologia continental, a qual se inscreva dentro de um reconhecimento capaz de criar no povo a consciência de que é ele que deve construir a sua história, criar sua cultura e construir sua identidade cristã e religiosa. A espécie humana tratada como não-pessoa, dá lugar à virada antropológica humana, inclusiva e libertadora pois, não há mais lugar para a submissão e o domínio. Faltando esta intuição de cada ser humano na interpretação dos elementos simbólicos vistos à luz da fé, nada é percebido em Maria como epifania simbólica.

4)- A mulher de hoje e sua nova consciência

Diante da proposta de uma antropologia humana, inclusiva e libertadora exige-se uma nova consciência antropológica. Na descoberta de muitos arquétipos ligados ao Feminino, a mulher de hoje costura os pedaços de vida sacrificada da humanidade inteira para resgatar o retorno da Grande Mãe e da Grande ‘deusa’, que traz consigo a misericórdia do nosso Deus, a ternura de suas entranhas divinas e a leveza de seu sopro perfumado do Espírito. A reflexão teológica feita na ótica da mulher cristã e católica em diálogo, nada reivindica quando sente o chamado que o Senhor lhe faz. O Senhor incluíu todas as mulheres na história da salvação, assim como o fez com Tamar (Gn 38, 14-18), com Raab (Js2,1), com a mulher de Urias (2Sm 11, 1-5), com Rute (3, 7-15), e de um modo consentâneo à própria missão, o faz com Maria de Nazaré ( Mt 1,16), independente da linhagem de cada uma. Não afirmamos, mas argumentamos: temos consciência de que o elemento feminino está sobre o altar.

Dois fatos mostram o avanço do significado de Maria na nossa cultura. São eles: a figura da Maria histórica em muitos e variados ambientes populares; estes se encontram já a caminho de uma conscientização e abertos a uma reflexão mariológica que se expressa numa prática pastoral, articulada no dia-a-dia de cada comunidade de fé. Este processo tende sempre mais colocar Maria como mulher companheira de caminhada rumo ao Pai, mulher do povo que constrói o Reino com ele e mulher lutadora pela mudança de condições de morte em condições de vida digna e agradável a Deus.

O segundo fato é referente ao avanço de toda a simbólica mariológica alimentada pela grande maioria do nosso povo simples e empobrecido, simbólica que se manifesta no culto de caráter devocional; este passa gradativamente a se manifestar no universo religioso de cada comunidade através de cantos, celebrações, orações e até mesmo nas alegorias representativas do carnaval brasileiro. Tudo isso é elemento formador de uma consciência crítica que o povo tem da Virgem que peregrina com ele na opressão, mas um povo cheio de fé e grávido de esperança por dias melhores.

Se há muito que criticar da figura simbólica de Maria no universo cultural e religioso dos nossos povos, pode-se afirmar também de que esta Maria tem muito a ver com o seguimento de Jesus Cristo. Os nossos povos encontram em Maria a figura feminina que os precede no caminho de Jesus Cristo e n’Ela encontram o sentido da própria luta em favor da vida com abundância. A comum-união da Maria histórica como Maria simbólica ou da Maria simbólica como Maria histórica, torna-se evento de fé autêntica quando o povo vive a experiência do Pai como o Deus sumamente benigno e sábio, o Filho como o Enviado do Pai e o Espírito Santo como o plasmador da pessoa humana. (cf. LG, 52.56). Excluir Maria desse processo ou ofuscar sua participação ativa que se faz mistério para a nossa limitada compreensão, é ignorar a interrelação ‘ad intra’ e ‘ad extra’ que é a vida da Comunidade divina.

Para concluir:

Entendemos que o significado de Maria na nossa cultura, à luz das Pessoas divinas em relação, é visto a ‘olho nu’, em três fatos que já têm sua história e sua caminhada distinta em todos os Continentes povoados da nossa Mãe-Terra. São eles:
1)- O nosso povo tem seu modo de cultuar a Maria que não exclui nenhuma das Pessoas da Comunidade divina. É a reflexão teológica que não consegue elaborar o desafio pastoral levantado pelo jeito que o povo tem de encontrar em Maria um canal de sua fé cristã e católica.
2)- A presença maciça das mulheres em quase todas as instâncias da vida humana com seus segmentos políticos, sociais, culturais e religiosos.
3)- A mudança de paradigma que mostra a queda do patriarcado na qual o homem começa sentir a necessidade de fazer acordo com a mulher, percebe que não é pelo domínio e nem pela determinação só dele que pode caminhar para frente. Mas homem e mulher Deus os criou (cf. Gn 1,27).

MARIA, FILHA PREDILETA DO PAI

Mãe Aparecida do Povo do Brasil
Amor – culto – cultura
Irmã Lina Boff
Professora da PUC-Rio, de Petrópolis e convidada pelo Antonianum de Roma
Prólogo: filha predileta do Pai
Esta frase evoca uma verdade fundamental da nossa fé cristã e católica, que é a filiação divina, nem sempre colocada na evidência teológica e mariana em que ela merece estar colocada. Se Maria é a filha predileta do Pai, como bem afirma o oitavo capítulo da Lumen gentium, perguntamos já de saída:
- Em que sentido Maria - a mulher do Antigo Testamento que abre o NT - vive esta filiação divina que a faz merecedora do título: filha predileta do Pai?
- De que modo se torna ela inspiração para a vivência da nossa filiação divina, no século XXI, da era digital e da globalização extremada?
- Qual sua influência nas expressões de amor ao Deus Uno e Trino da nossa fé, manifestadas no amor, no culto e na própria cultura?

Introduzindo o assunto
Maria é filha predileta. Em primeiro lugar é filha porque recebe de Deus o dom do seu amor que se manifesta na comunhão vital, pessoal e íntima que ela alimenta e vive com seu Deus. Esta intimidade que Maria vive ao longo de sua vida terrenal e ao mesmo tempo alimenta com seu SIM continuado, não é só física, mas uma comunhão de relação amorosa que ela recebe e acolhe de seu Deus e a esta relação se abre, inteiramente, a ponto se tornar uma comunhão histórico-salvífica, mediante a qual Deus a torna participante da história da salvação de todo o seu povo, e por graça da infinita liberalidade do Pai, a toda a humanidade. Esta concepção é a concepção bíblica predileta do Antigo Testamento que condensa a experiência histórico-salvífica do povo escolhido, na Pessoa do Messias que realiza o Projeto do Pai na história e o plenifica com sua morte e ressurreição.
Por isso, na base da tradição vétero-testamentária, há a eleição de Israel, pela qual o povo vive uma relação de filiação como um dom especial de Deus, porque o destino desta relação é escatológico, ou melhor, eterno. No Novo Testamento, a concepção de filiação divina que Jesus mesmo pouco utiliza em sua pregação do Reino, passa a ser palavra típica do cristianismo primitivo, que encontra sua raiz no batismo de Jesus: Tu és meu filho querido, eu, hoje, te gerei (Lc 3,22); na oração de agradecimento ao Pai pela missão dos setenta e dois discípulos, na qual repete a invocação Pai, por cinco vezes: Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste essas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim foi do teu agrado. Tudo me foi entregue por meu Pai, e ninguém conhece quem é o Filho se não o Pai, e quem é o Pai se não o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar (Lc 10, 21-22). A palavra Filho nesta breve perícope, é empregada por três vezes e em relação ao Pai, com quem o Filho entra na intimidade que plenifica a vida temporal e aponta para para a transcendência dos fatos históricos do povo de Israel. Pois, as coisas que o Pai ocultta às pessoas sábias e entendidas, não são facta bruta, mas vêm carregados de sentido e de graça salvadora.
A Carta aos Hebreus afirma, estar acima a dos anjos a ação de Jesus na história, porque veio ocupar-se, como Filho dileto, Filho querido da descendência de Abraão, por isso o autor sagrado repete: Tu és o meu Filho dileto, eu hoje te gerei! (Hb 1,5).
Jesus se sente Filho, e assim se relaciona com o Pai. É esta consciência que o consola quando se sente abandonado e rejeitado pela humanidade insana. A consciência que Jesus tem desta realidade e que nos dá a conhecer, de que só o Filho conhece, verdadeiramente, o Pai e de que só o Pai, conhece, verdadeiramente, o Filho, nos leva a uma afirmação que tem fundamento na eleição do povo de Israel. Jesus pertence ao povo de Israel, o povo eleito, e Ele é o escolhido dentre o povo eleito para dar a conhecer o mistério do Pai que ficou escondido há séculos e só agora, na pessoa do Filho dileto, é conhecido e anunciado a todas as nações (cf. Rm 16, 25ss). A eleição, a dileção que o Pai tem para com Jesus, é o fato de que Ele, como Filho, se abre de tal forma ao Plano do Pai, que este pode contar com Ele para a realização de seu Plano de Salvação.
Jesus, portanto, é o Filho dileto do Pai, é o preferido na estima e na afeição, é querido e especialmente, amado. Na prosa do padre escritor, Manuel Bernardes, presbítero da Congregação do Oratório de São Felipe Néri, em sua obra, Exercícios Espirituais, do século XVIII, utiliza o superlativo da palavra dileto para falar da íntima dileção de Deus Pai para com seu Filho:
Já que meu Deus foi tão misericordioso para com os homens, que os quis ensinar pela própria pessoa de seu diletíssimo Filho, ... eu quero, mediante a sua graça, aprender por este exemplar .
Pode-se evidenciar a intensidade da linguagem e a profunda mística que envolve este escritor clássico da prosa portuguesa. Enquanto que a palavra predileção, que também deriva da língua latina e que quer dizer quase a mesma coisa, pode ser explicada, em sua etimologia, da seguinte forma: estar diante da pessoa que se ama. A partícula pre, no latim, denota estar diante de, e dileta, dileção, significa a pessoa preferida na estima, na afeição, querida, especialmente, amada, palavra só dada a Jesus. Por derivação do amor que o Pai devota ao Filho, Maria é a filha pré-dileta do Pai, e é mãe do Filho diletíssimo do Pai, que é Jesus.

A perspectiva do Antigo Testamento
A linhagem bíblica de Maria de Nazaré, denominada pelos padres do Concílio Ecumênico Vaticano II, filha predileta do Pai (LG 53), por estar unida ao Pai, encontra-se ao mesmo tempo caminhando com a humanidade, filha de Adão e Eva, participando da mesma sorte e do mesmo destino. Este vínculo não se dissolve porque está intimamente, conectado com a missão desta mãe – a de marcar a História da Salvação com seu SIM incondicional e livre.
Nesse sentido, Maria está presente e vem da linhagem das Mulheres do Êxodo, que tementes a Deus, pouparam a vida de tantos meninos hebreus, desde o nascimento entre as duas pedras, com a finalidade de manter a presença numerosa dos hebreus em meio a um povo estranho (cf. Êx 1, 15-22). Vem da linhagem da filha do Faraó que arriscou sua nobreza terrena para salvar o Menino tirado das águas, prenúncio de libertação do povo escolhido por Javé (cf. Ex 2, 5-10).
Estas mulheres mostram que não querem a vida só para elas, mas têm consciência de que foram criadas para viverem como filhas e filhos do Criador, que é Pai de todos: poupam a vida dos meninos hebreus, porque a vida é um direito que pertence ao Deus Criador que tirou tudo do nada e não aos homens e nem às mulheres. Deus escolhe pessoas que cuidam da vida. E estas pessoas são mulheres de todas as classes sociais. Nesse contexto, encontramos as parteiras Sefra e Fuá e a filha do Faraó, que segundo a historiografia da exegese contemporânea, aparecem com nomes incertos, mas são apresentadas como mulheres que defenderam a vida arriscando a própria vida e a condição em que eram colocadas.
A filha predileta do Pai, é da estirpe das numerosas filhas de Jerusalém, como narra o mais belo Canto que celebra o amor de um Amante e de uma Amada-amante, que se aproximam e se distanciam, se procuram e se perdem, se buscam e se encontram, mas, se unem no amplexo do amor do meio-dia que não tem sombras, numa interpretação alegórica do amor humano que transcende a terra para chegar ao céu (Gregório de Nissa comentando o Cântico dos Cânticos em Ct 1,5+8,4).
A filha predileta do Pai, vem da árvore genealógica da tradição israelítica, em que a figura feminina protagoniza o momento de esplendor e de projeção que aponta para o sentido universal e coletivo da presença de Javé em meio a seu povo. As filhas de Israel são carregadas sobre as ancas para celebrar o retorno do exílio e o esplendor da cidade santa e sagrada pelo povo; é filha que recebe a luz de Javé, trazendo as riquezas da terra e as riquezas da glória e esplendor do Deus que edifica, enaltece e realiza as coisas que promete (cf. Is 60,4).
A filha predileta do Pai, é a filha de Sião, membro do povo de Israel a quem é dirigida a profecia com estas palavras: Farei de ti eterno motivo de orgulho, motivo de alegria, de geração em geração (cf. Is 60,14). O profeta acrescenta ainda: Serás chamada Procurada! Cidade habitada! (Is 62,12).
A filha predileta do Pai vem de uma aproximação das várias expressões bíblicas do Êxodo e dos Profetas. Com a expressão “filha predileta do Pai”, pode-se deduzir que esta se encontra na figura de Maria, a profetisa, irmã de Moisés, que pega no tamborim e todas as mulheres a seguem com seus tamborins também, para cantar e dançar a libertação de seu povo. Elas estão nas expressões que o autor sagrado tanto repete nesta narrativa: Os filhos de Israel, Israel (cf. Êx 14-15), expressões que têm como desfecho a Maria do tamborin, que toma a iniciativa de proclamar a Javé, vestido de glória pelos seus feitos (cf. Êx 15,21). Nesta narrativa ela não é chamada de filha, mas pertence ao povo de Israel que se organiza com suas filhas e filhos, para dar o golpe no Faraó e marchar em direção à Promessa feita a Abraão, a Isaac e a Jacó. Esta é a filha predileta do Pai que participa, com seu povo e seus chefes, incluindo e dando igualdade de dignidade filial a todos e a todas.
A filha predileta do Pai, vem da linhagem profética do espírito de Javé. Aqui, ela não pode deixar de estar na efusão do espírito profético sobre todo o povo de Deus, preanunciado pelo profeta Joel e proclamado por Pedro, em seu primeiro discurso aos povos de tantas proveniências, no dia de Pentecostes (Cf. Jl 3, 1-5 e At 2, 16ss). Joel fala desta nova criação, afirmando que Javé derramará seu espírito sobre vossos filhos, e, dirigindo-se às filhas de Israel, o profeta é claro: ... e vossas filhas profetizarão. Esse espírito da profecia será derramado, igualmente, sobre as escravas (Jl 3, 1-2). Não é esta a filha predileta do Pai que tem a coragem de inaugurar novos tempos de inclusão e igualdade para todos e para todas? É no espírito de Deus que tem origem a filha predileta do Pai. Por isso, ela é uma personalidade coletiva que ultrapassa a própria figura e a própria corporalidade com que foi plasmada pelo Pai, Criador de tudo e de todas as coisas.
A filha predileta do Pai, é uma personalidade simbólica, portanto, porque coletiva. Não é uma pessoa privada, mas sua representavidade cobre todo o povo de Israel e se torna uma protagonista ao participar na realização de sua libertação dos opressores. Ela está na arte, na música, na pintura e na ópera que perpassa os tempos e as modas. A ópera de George Frederic Handel (1742), intitulada MESSIAH – O Messias – por exemplo, é apresentada com vigor e majestade, na sua forma narrativa, adaptando as cenas destes textos bíblicos para fazer um espetáculo que perpassa os séculos e continua, todavia, até em nossos dias, enchendo-nos de contemplação e mística, Handel com seu veio musical e seu pendor religioso e genial, nos anuncia que o Reino está no meio de nós, através da sua narrativa que perfila os traços característicos do Filho diletíssimo do Pai, figurado em Isaías; e os traços da filha predileta do Pai, que participa do amor que o Pai dá ao Filho e que caminha conosco pelos caminhos da vida dos nossos povos.
Finalmente, a filha predileta do Pai, é celebrada de forma lírica nos momentos da liturgia israelítica, em que povo refresca a memória de sua caminhada histórica feita de eventos e de fatos que marcam, continuamente, a progressiva revelação do Deus da vida e da razão de viver do povo. Esta lírica religiosa nos foi conservada pelos Salmos. Estes falam da filha predileta do Pai, como a filha de Judá, que exulta porque o Senhor está presente com sua justiça em todas as cidades. A filha de Judá é aquela que anuncia a grandeza de Javé desde a montanha sagrada de Sião. Por isso, é a filha de Sião que une e reúne todos os povos no louvor de um único Senhor e Deus (cf. Sl 48,12).
A filha predileta do Pai é semelhante às colunas que sustentam o palácio e sua beleza, as quais lembram as cariátides gregas, figuras femininas que amparam a justiça e o direito do rei.
Mas esta filha predileta do Pai, ao mesmo tempo que embeleza e guarnece os celeiros do Rei Eterno, com sua participação à vida divina como filha, evoca a prosperidade messiânica para todo o povo de Israel, que apostou em tantos reis terrenos e teve que suportá-los na sua iniqüidade, por tantos séculos e até milênios. Esta filha amada, é a predileta do Pai, porque aponta para a intercessão do Filho junto ao Pai, intercessão da qual participa, trazendo as riquezas messiânicas da liberalidade de Deus Pai para com seus filhos e filhas que somos todos e todas nós.

Como tudo isso se atualiza na perspectiva do Novo Testamento
Comecemos pela mulher que se destaca pela missão que Deus lhe pediu. A mulher escolhida para ser a mãe do Messias, o Enviado do Pai, o Filho diletíssimo do Pai, não podia deixar de ser a filha predileta deste Pai, que revela suas entranhas de mãe, no dizer dos profetas , e no dizer da pregação do Reino feita por Jesus. Ele toma o exemplo da mulher que se alegra ao encontrar a moeda perdida, ao fazer o pão que cresce com o fermento, ao admirar-se da fé indevassável da cananéia e da coragem das mulheres da primeira hora na manhã da ressurreição. A todas estas mulheres, na pessoa das últimas – as da manhã da ressurreição – recebem do Ressuscitado a missão de serem anunciadoras da Boa Nova da vida trazida pelo Ressuscitado, que se mostrou por primeiro, às mulheres e a estas deu-lhes a missão de anunciarem aos discípulos, seus irmãos, a Boa Nova da ressurreição do Filho de Deus, o Cristo Senhor que se torna o doador da vida divina. A esperança do povo de Israel começa a se realizar na medida em que as pessoas aderem a esta Grande Novidade.
A predileção de Deus com relação a Maria, a humilde serva do Senhor, evoca os primeiríssimos tempos da insurreição do ano 70 d.C., em que sempre se constata a presença do servo entre os hebreus. Como filha predileta do Pai, Maria anuncia a livre iniciativa do Pai com relação a sua vida e a sua missão junto ao povo de Israel ao se proclamar serva do Senhor; e é filha predileta porque grandes coisas fez em mim aquele que é todo poderoso.
Maria é filha predileta do Pai porque crê na ação da providência que lhe faz tomar consciência de que o filho que ela gera de suas entranhas é o Filho de Deus. Ela é a predileta porque se encontra sempre presente nas discussões mais aferradas que se estabelecem em torno à origem humana e divina de seu filho, que até na metade do II século, o problema genealógico do Cristo, não estava ainda apagado, na Igreja daquela época. E hoje, a quantas estamos?
A filha predileta do Pai, no Novo Testamento, portanto, se encontra no contexto e na história factual da mulher que busca Jesus porque Ele responde às profundas interrogações que ela mesma se coloca diante de seu Deus e de seu jeito de pronunciar e invocar seu nome santíssimo. Nesta busca a mulher – a filha predileta do Pai do tempo de Jesus – entra em relação direta e encontra-se com Jesus, e tem com Ele uma relação que ultrapassa a dimensão humana que a leva a fazer uma experiência de tocar o mistério que transcende a própria relação humana. A imanência manifestada por Jesus é vivida, pela filha predileta do Pai do Novo Testamento, como transcendência que redireciona a vida e a missão desta mulher.
A narrativa de Marcos nos fala de uma certa mulher que sofria de um fluxo de sangue há doze anos. É uma mulher doente, é a mulher da clandestinidade, vai além da lei, faz o papel de “penetra”, porque se aproxima de Jesus num momento em que muitas pessoas acorrem ao mesmo tempo à pessoa dele Jesus a chama de minha filha, e a presenteia com a notícia da cura: ... a tua fé te salvou; vai em paz e fique curada desse teu mal (Mc 5, 34.35). Na versão da comunidade de Mateus, encontramos esta expressão: Ânimo, minha filha, tua fé te salvou! (Mt 9,18). Jesus percebe a angústia e a ansiedade com que esta mulher toca a orla de seu manto em meio aos discípulos de João, que um após outro, intervém, incluindo um chefe de sinagoga que implora pela filha já morta, sem contar os curiosos que se aglomeram. Tudo está acontecendo ao mesmo tempo.
Em meio a esse tumulto, a mulher apresenta-se sozinha, ninguém a acompanha, e ela tem consciência de como está sendo vista e tratada por todos os que estavam aí: ela é uma pessoa “impura”, que a Lei a exclui por ser “impura”. Mas Jesus une e reúne esta mulher à coletividade que o cercava e a trata com a mesma consideração dada a todas as pessoas que O solicitam, naquele momento. Ela a inclui na sociedade que não quer saber dela.
A mulher da doença que a envergonha diante de seus conterrâneos e conterrâneas, sai da exclusão social e religiosa e da exclusão econômica também, pois havia gasto todos os seus bens sem resultado. A cura é atribuída à sua persistência e à sua fé: Ânimo, minha filha, a tua fé te salvou! (Mt 9,22). O encontro desta mulher com a cura definitiva, é fruto de sua invisibilidade, clandestinidade e seu silêncio cheio de fé, três pequenas coisas que roçam, que tocam o manto, de leve, do Messias e guardam dentro de si poderes de infinito.
Os pequenos e grandes gestos feitos por Jesus, nos levam a pensar que tais gestos são verdadeiros “sinais” que revelam o “rosto” do Pai que está presente na pessoa do Filho que se aproxima das mulheres. Não seriam estas as filhas prediletas do Pai do tempo de Jesus? A hemorroíssa encontra-se com Jesus às escondidas, daí a frase encorajadora dele: Ânimo, minha filha! E sem querer, nem premeditar, o ato desta mulher vem a público.
Em outro contexto descrito por Lucas, Jesus vê uma mulher recurvada de nascimento, fora do templo fazendo sua prece a Javé, porque, segundo a lei de Moisés, não lhe é permitido o acesso ao lugar sagrado pela deficiência com que nasceu. O ensinamento de Jesus dá um novo sentido a esta lei e retoma a fé exemplar de Abraão, e com autoridade, sem rodeios, contrapõe: Esta filha de Abraão, não tem o direito que o boi e o asno do estábulo têm, de beber água em dia de sábado? (cf. Lc 13,14s). Esta mulher nada pede a Jesus. É Ele que se aproxima para tirar-lhe o estigma que a excluía do lugar sagrado, que para o judeu ter contato com o Templo de Jerusalém significava observar, rigidamente, sérias prescrições ditadas pela Torá. Esta filha de Abraão, isto é, filha da herança deste povo fiel a Javé, tem o direito de ser incluída junto com todos os seres humanos que aí se encontram, no templo sagrado e de viver a lei que foi dada para todo o povo, não para estar fora do templo, mas dentro dele e da sua sacralidade.
Para chegar a esta inclusão, Jesus não olha para o templo e nem para o tempo considerado, segundo a religião do povo, tempo sagrado. O sagrado foi feito para servir à pessoa humana necessitada e não para submeter esta pessoa ao sagrado. O sábado foi feito para o ser humano e não o ser humano para o sábado (cf. Lc 13,16). Esta filha de Abraão lembra a dignidade humana e o direito, ela pertence à nação eleita, à descendência abraâmica. Ela não é apenas uma descendente da fé abraâmica, mas é da descendência messiânica. Ela é da mesma árvore genealógica, da mesma estirpe de Abraão, mas participa da descendência do Messias esperado pelo. Neste episódio, Jesus percebe, claramente, que a plenitude e o cumprimento da lei, passam também pela transgressão do sagrado, para que haja misericórdia, inclusão, vida e não sacrifício. Este é o espaço sagrado da vida.
Em João e sua comunidade, a filha predileta do Pai é um nome coletivo, é a filha de Sião, o povo eleito, o povo da Aliança que recebe seu Rei-Messias montado num jumentinho (cf. Jo 12,15). O autor resgata a memória do povo que deve voltar a retomar a doutrina messiânica que ressurge da casa de Davi. Há uma preocupação em apresentar a humildade do Messias que está para chegar, em vestes simples e atitude pacífica, contrapondo-se aos reis históricos que o povo teve antes. Esta figura é retomada também por Mateus e Marcos em suas narrativas da paixão. A preocupação que o profeta Zacarias mostra com a restauração do culto do templo, transparece também no Messias que vem para celebrar a aliança que o povo deve retomar.
Concluindo nossa reflexão, podemos afirmar que Maria vem na linhagem das grande mães do povo de Israel, das proféticas matriarcas que sempre se colocaram do lado do povo e das mulheres que no tempo de Jesus, buscavam n`Ele aquilo que a mãe sempre busca para salvar seus filhos e filhas. Maria está presente nas “Marias” de hoje e como discípula-mãe, nos acompanha precedendo-nos no seguimento de Jesus, seu filho e Filho do Pai Eterno. Amém!